UMA GUERRA QUE NINGUÉM VIU

Sua pequena terra onde vive seu pequeno povo é dividida entre dois países do chamado Primeiro Mundo com o desígnio, já examinado, de explorar seu território no arrebatamento dilacerante do capital por minérios importantes para o funcionamento do outro mundo, o pós-moderno e urbano, diferente de sua cultura pacata e rural.

Seu povo é pequeno, vive em uma ilha afastada dos grandes centros e recebe um embargo econômico e estrutural do país mais próximo que antes governava sua terra. A eletricidade é desligada, a alimentação é cortada, e todos os outros aparatos de sua sobrevivência somem, de uma hora para outra, e todo o resto, que permaneceu inteiro, é bombardeado pelas forças do novo inimigo: seu antigo governo tirano, o qual vendeu sua terra a uma grande multinacional: a Rio Tinto Zinc.

“A Rio Tinto é uma multinacional inglesa e australiana do ramo de mineração, com escritório central Londres, Inglaterra. A empresa britânica Rio Tinto Company foi formada em 1883 para explorar minas de cobre em Rio Tinto, no Sul da Espanha. Pouco depois, em 1905, surgiu na Austrália a Consolidated Zinc Corporation, relacionada à extração de zinco em Broken Hill. A fusão das duas empresas ocorreu em 1962, formando a RTZ (The Rio Tinto-Zinc Corporation)” – informações retiradas da apresentação da empresa.

A Rio Tinto, então, entra no território onde você vive, abre uma cratera abissal onde antes havia floresta, explora, consegue o que quer, e vai embora por que seu povo não quer mais viver sob o caudilhismo da multinacional. Ela parte, mas deixa de herança cicatrizes ambientais para os próximos 200 anos.

A gigante cratera que pode ser vista por imagens de satélite.

Geograficamente, etnicamente, culturalmente, Bougainville sempre foi parte das Ilhas Salomão. Contudo, cem anos atrás, o imperialismo, como aconteceu nos quatro cantos do globo, decidiu mudar isso de forma antidemocrática. Muitos foram os mandantes da Ilha de Bougainville desde que seu explorador, o francês Louis de Bougainville, “descobriu” o paraíso.

Sob tratados ditatoriais entre Alemanha e Inglaterra, Samoa foi dividida em duas: “vamos deixar A Samoa Ocidental pra vocês”. Inglaterra disse: “fique com Bougainville”. E assim consecutivamente, passando pelas mãos da Inglaterra e Japão até ser tomada por Papua Nova Guiné, que conseguiu independência em 1975, Bougainville viveu sob o ataque feroz dos mercantilistas afobados. A ilha chegou a pertencer mais a um empreendimento do que a qualquer governo ou tipo de comando estatal que estivesse acima dos negócios dos estrangeiros.

Mas nesta pequena ilha vivia um povo díspar. Um povo intenso e distinto. Se todas as cenas do filme “A revolução dos Cocos” forem verdade, a luta entre os armados da BRA, exército de Boungaiville, contra o exército PNG, da Papua Nova Guiné, pela independência dos primeiros, o local e a guerra que lá existiu por muitos anos é uma amostra declarada de revolução. Revolução de um povo pobre, desarmado, doente e sob embargo econômico, vivendo em montanhas a partir do sistema igualitário de vida, plantando o necessário para se alimentar, conseguindo energia elétrica a partir de pequenas hidrelétricas fabricadas com destroços e sapiência puramente humana. Um povo que luta contra o bombardeio de helicópteros contra armas de mão, mas que mesmo assim tem tempo de criar sua própria música a partir do coco. Não só a música, mas a força da água da fruta para a saúde, a casca queimada para tratar de ferimentos, um inseticida à base de pó de coco, azeites, combustíveis e até mesmo sabão.

O filme envolve o espectador através da trilha sonora aconchegante, a qual em algum momento serão mostrados os instrumentos, uma história emocionante de luta armada de uma minoria contra o imperialismo, e uma tentativa de sociedade ainda desconhecida pela maioria do mundo: do povo mandando no governo.

Nem mesmo eles sabem afirmar se isso vai dar certo. Mas um de seus líderes, o qual perambula pela mata cortando lenha para as mulheres velha viúvas, explica em uma passagem o porquê de uma de suas falas: “o governante deve limpar as botas de seu povo”. Através de três principais motes de dar sequencia a tentativa de libertação: 1. Lutar pelo homem e sua cultura; 2. Pela terra e o ambiente e 3. Independência, a pequena ilha de Bougainville foi ganhando adeptos da causa e conseguindo até mesmo o apoio popular e de dissidentes do PNG.

A revolução dos Cocos” é um filme leve, por mais que o assunto possa parecer pesado, e mostra, em aproximados 50 minutos, que o mundo é feito de milhares de culturas e que nenhuma delas pode se sobressair sobre as outras. “Não há saberes maiores ou menores, há saberes diferentes”*.

Bougainville é a maior das ilhas do grupo que forma o arquipélago das Ilhas Salomão e faz parte da Papua-Nova Guiné. Tem uma população aproximada, contando suas ilhas menores vizinhas, de 175.600 habitantes. Hoje, desde o cessar-fogo de 1997, Bougainville é reconhecida internacionalmente como uma região politicamente autônoma.

UMA GUERRA QUE NINGUÉM VIU, pelo viés de Bibiano Girard

*Paulo Freire

bibianogirard@revistaovies.com

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