MINISTRA ANA DE HOLLANDA DESMASCARADA: A POLÍTICA SUJA MINISTERIAL

Em meio a toda polêmica em torno das últimas decisões da Ministra da Cultura Ana de Hollanda, muita coisa ficou mal contada.

Ciberativistas como Sérgio Amadeu e João Carlos Caribé, dentre outros, e o Deputado Federal Paulo Teixeira (PT/SP) não tardaram em discordar publicamente das atitudes da ministra, como a retirada da licença Creative Commons do site do ministério e o visível fortalecimento do ECAD, além do silêncio que a mesma mantém frente às críticas que recebe até mesmo do ex-ministro Gilberto Gil.

Boa parte dos movimentos alinhados à cultura digital e coletivos logo se insurgiram, com muitos chegando a pedir a cabeça da ministra e a reação não tardou. Ignorando completamente as declarações e textos de Sérgio Amadeu, Ronaldo Lemos, Rodrigo Savazoni e outros especialistas em cultura digital, a ministra resolveu “se defender” partindo para o ataque e usando o próprio site do ministério.

Ministério ao Ataque

Sua arma foi o neo-direitista Caetano Veloso, em texto pego “emprestado” do jornal O Globo e devidamente aparado, ou melhor dizendo, visivelmente mutilado e tendo as partes em que Veloso critica Lula, cortadas (vejam aqui o texto na íntegra). Caetano defende uma posição extremamente conservadora, anti-internet e compartilhamento livre, fazendo ode ao direito autoral e, sem dúvida, servindo aos propósitos pró-ECAD do MinC atual.

Ficou no texto o que interessava… à Ministra. Foram copiados os dois primeiros parágrafos do texto, enquanto o resto, coalhado de críticas a Lula, foi limado. É o mesmo tom adotado pela grande mídia que agora passou a tentar apagar o legado de Lula, elogiando Dilma naquilo que não atrapalhe muito seus interesses e opondo estes pontos ao que foi feito por Lula.

Além disso, aquilo que era escrito pelos ativistas, contrários às posições adotadas pelo ministério, foi sumariamente ignorado. Não há direito ao contraditório.

O texto, ao ser mutilado e adaptado às necessidades do ministério, deixa clara a posição oficial de Ana de Hollanda – e por conseguinte, a do Ministério da Cultura – de entrar em confronto direto com os defensores do livre compartilhamento. Além disso, o título escolhido para o texto, “Pontos Teimosos” nos faz temer sobre o futuro de uma das melhores iniciativas do MinC nos últimos anos: Os Pontos de Cultura.

Isto reflete qual será a prioridade do MinC nos próximos anos, a de privilegiar a classe artística formada por medalhões e aqueles que costumam estar nas paradas de sucesso ou serem muito regravados – através da já visível pressão do ECAD – em detrimento dos que fazem cultura livre, dos que buscam incluir através da arte e da cultura através de projetos e programas alternativos. Hoje, os pontos de cultura contemplam pelo menos 8,4 milhões de brasileiros, mas o interesse da ministra é privilegiar apenas 50 ou 60 grandes cantores/compositores, enfim, a indústria. Por não aceitar as mudanças previstas, os Pontos de Cultura são, então, chamados de “Teimosos”.

A posição do Ministério é, enfim, clara. E assustadora. E a reação está bem visível nos comentários da postagem do ministério. A população e os ativistas rejeitam as mudanças que irão beneficiar meia dúzia em detrimento de todo o país.

Vale também acrescentar que o conteúdo do jornal O Globo é fechado, proprietário, intocável e de reprodução proibida. Mas neste caso o Ministério não viu problemas em passar por cima da lei que diz defender e usá-lo. Estamos diante de um texto pirateado pelo MinC e, pior, remixado, pois foi mutilado e teve seu conteúdo alterado depois que o ministério notou que manter no site críticas tão diretas a Lula poderia pegar mal.

Mas, para além desta questão, há algo ainda mais perigoso, as relações ocultas da ministra.

Sobre gravadora e movimento estudantil: o MR8 aparece

Pese o silêncio do MinC e da presidenta Dilma Roussef, o nanico Partido Pátria Livre (antigo MR8, parte do PMDB) resolveu utilizar seu jornal, o A Hora do Povo, para atacar a posição dos ativistas e, em especial, o deputado Paulo Teixeira.

Não seria problema a crítica de um partido – insignificante – que nasceu unicamente para viver como apêndice do PT, como se vê no ato de lançamento do partido, em 2009:

“o que nós desejamos é compartilhar com todas as demais forças políticas e sociais que dão sustentação ao governo do presidente Lula as nossas idéias e propostas para que o Brasil ao invés de mergulhar no abismo da crise, abra as asas e alce vôo sobre ela. É nisso que se concentra o nosso programa. E ele pode ser resumido em quatro pontos básicos: Ampliar o mercado interno. Reduzir os juros. Concentrar os recursos do Estado para financiar a produção das empresas genuinamente nacionais – privadas e estatais. E dar prioridade a elas nas encomendas”

Tudo começa a se complicar quando pesquisamos um pouco mais fundo o relacionamento entre o partido, a Ministra Ana de Hollanda e a insuspeita União Municipal dos Estudantes Secundaristas de São Paulo (UMES).

A UMES é controlada há anos pelo MR8/PPL. Isto não é só conhecimento comum, como também basta uma rápida olhada nas notícias e destaques do site da UMES para notar a desproporcionalidade de citações do A Hora do Povo, declarações de membros do MR8 e JR8 (Juventude da organização) e citações ao grupo.

Na verdade, o mais importante é conhecer um pouco não sobre a UMES, mas sobre a CPC-UMES, ou Centro Popular de Cultura da UMES e, mais especificamente, sua gravadora, de mesmo nome.

O logo desta gravadora encontra-se claramente no topo da página principal do jornal A Hora do Povo o que, por si só, não seria grande problema, se seu presidente, Valério Bemfica – guardem bem esse nome -, não fosse também membro do Comitê Central do MR8. Vejam o que diz o próprio jornal A Hora do Povo:

A juventude também debateu a atuação no movimento estudantil, após a exposição feita por Márcio Cabreira e, na quinta-feira, foi realizado o debate sobre Cultura, com a palestra de Valério Bemfica, membro do Comitê Central do MR8 e presidente do Centro Popular da Cultura da UMES (CPC-UMES).

Bemfica preside o CPC-UMES desde pelo menos 2007 e, aparentemente, ainda está no comando (seu sobrenome foi grafado Benfica e não Bemfica neste link), palestrando na Bienal da UNE, em janeiro deste ano.

A Ministra e suas relações perigosas

Até agora, nada demais. Todos sabem que o movimento estudantil está nas mãos de partidos e organizações, a UNE e UBES com a UJS/PCdoB e a UMES com o MR8/JR8/PPL. O problema começa realmente quando notamos a ligação desta gravadora com a ministra Ana de Hollanda e com as críticas dirigidas à militância pró-CC, em especial ao deputado Paulo Teixeira. A gravadora CPC-UMES é a mesma da Ministra Ana de Hollanda.

Reparem na relação entre a ministra, a CPC-UMES e Valério Bemfica, do MR8. Este rapaz foi o responsável pela “reportagem” na página 4 do A Hora do Povo de 9/10 de fevereiro de 2001, edição número 2.934 cujo título e primeiros parágrafos lêem:

Retirada de propaganda de ONG dos EUA do site do MinC foi ato soberano

Ao contrário do que afirmou o deputado Paulo Teixeira (SP), líder do PT na Câmara dos Deputados, a licença Creative Commons não está, felizmente, dentro de uma política de governo

VALÉRIO BEMFICA

O deputado Paulo Teixeira (PT/SP) acaba de ser guindado ao posto de líder do PT na Câmara dos Deputados. Precisa dar-se conta de que, quando se chega a um posto tão importante, é preciso manter os olhos bem abertos. Vai aparecer muita casca de banana no caminho do nobre parlamentar. Causas que, abaixo de uma fina – e falsa – embalagem libertária, escondem interesses tão escusos quanto poderosos. Preste atenção, deputado, pois o senhor já deu a primeira escorregada.

Trata-se do episódio recente em que a ministra da Cultura, Ana de Hollanda, retirou do site do MinC a acintosa propaganda de uma ONG norte-americana abertamente financiada pelos monopólios da indústria da internet (Google, Yahoo!, Facebook, entre outros) e por fundações para lá de suspeitas (Ford, Rockefeller, Soros, etc.). Um ato de soberania e de respeito às leis do país.

Mas eis que o deputado deu uma entrevista à Agência Carta Maior questionando a atitude da ministra. Vamos rapidamente esclarecê-lo, pois não pega bem o líder do partido da presidenta afirmar coisas que não têm a mínima sintonia com a realidade.

Comecemos pela afirmação de que “A licença Creative Commons está dentro de uma política de governo”, que abre a entrevista. Não, deputado, felizmente não está. Aliás, se os ditames de uma ONG suspeita fossem inseridos em políticas de governo, não passaríamos de uma república de bananas. E muito menos tem respaldo na política do Itamaraty, que foi conduzida nos últimos oito anos por dois profundos conhecedores das questões culturais: o ministro Celso Amorim e o embaixador Samuel Pinheiro Guimarães. Pelo contrário, longe de criticar a Lei Brasileira de Direitos Autorais, nossa política externa, entre outras coisas, foi defensora intransigente da Convenção da Diversidade Cultural da UNESCO, que tem como um de seus pilares principais a proteção à criatividade dos povos e à figura dos criadores.

Deixemos de lado o tom nacionalista estúpido e a completa ignorância sobre o tema por parte do autor, Valério Bemfica, e apenas nos concentremos no alvo de seus ataques, o Deputado Paulo Teixeira, um dos raros petistas a discordar da posição da ministra e deixar isto claro. Em entrevista concedida à Agência Carta Maior, o deputado defendeu com todas as letras o uso do Creative Commons e se opôs à ministra:

A licença Creative Commons está dentro de uma política de governo, de democratização do acesso ao conhecimento e à cultura. Tem respaldo na política externa praticada pelo Itamaraty, crítica da lei de direitos autorais aprovada pelo país. Ela é usada em vários órgãos da administração federal. A sua retirada contrasta com decisões anteriores que vêm do governo Lula.

Um novo elemento complicador

A história fica ainda mais interessante quando observamos o “manifesto” promovido pelo maestro Marcus Vinicius de Andrade (que por alguma razão acabou com o Marcus Vinicius grafado como Marco Venicio, ainda que o e-mail seja grafado como o primeiro) em defesa da Ministra, utilizando os mesmos argumentos nacionalistas e ultrapassados de Bemfica e contando com o apoio de ao menos três compositores – todos com mais de 50 ano.

O maestro Marcus Vinicius de Andrade nada mais é que o diretor artístico da CPC-UMES, a mesma entidade/gravadora comandada por Bemfica!

Marcus Vinicius de Andrade é ligado diretamente ao ECAD, através da Associação de Músicos, Arranjadores e Regentes (AMAR-SOMBRÁS), da qual ele é presidente. à idéia de se criar um órgão para supervisionar o ECAD, proposta discutida durante a gestão de Gilberto Gil e Juca Ferreira no Ministério, o maestro foi veemente:

Além do mais, as associações autorais receiam que, afora o ímpeto controlador característico do atual governo, o MinC esteja querendo avançar nesse setor economicamente relevante para criar mais um cabide de empregos para os aliados do governo (isso fora os 153 mil novos funcionários contratados nos últimos sete anos, cf. Revista Veja n° 2152, de 17/2/2010), fato deplorável que a opinião pública brasileira repudia sumariamente.

[…]é absolutamente descabido pensar no Estado interferindo na gestão de bens e direitos privados. Se você quer saber, o que eu sou mesmo é defensor do controle do Estado pelos cidadãos…

Sobre a gestão participativa do MinC, mais veneno e já começa a aparecer a tese nacionalista do “estrangeiro” intervindo:

[…]o MinC sucumbiu ao assembleísmo pueril e preferiu discutir os temas culturais e autorais em “plenárias” de qualificação e legitimidade duvidosas, porque quase sempre compostas por claques de palpiteiros e meros curiosos.

Desse debate apressado e – por que não dizer?- leviano, no qual foram ouvidos até usuários inadimplentes e representantes de interesses estrangeiros desejosos de enfraquecer a relevância autoral do Brasil, saíram as novas ideias do MinC sobre Direito de Autor, inclusive o apregoado projeto de lei autoral (que ainda ninguém viu).

Ele vai além, atacando as políticas adotadas, como pro exemplo o compartilhamento de conhecimento em um discurso que mistura teorias pseudo-marxistas e dependentistas com a defesa do direito autoral, que inibe o conhecimento:

[…] foi extremamente negativo ver o MinC de Gil abraçando ideias de fundo neoliberal, como a flexibilização dos direitos dos cidadãos, a cultura da (falsa) “gratuidade”, a informalidade na produção da cultura, a desmonetização dos bens e serviços culturais, etc.

Um país como o Brasil, que é produtor de cultura, que já foi o 6° mercado discográfico do mundo e que tem uma música popular reconhecida e valorizada internacionalmente, não pode dar-se à leviandade de jogar essa riqueza por terra para assumir uma postura coitadinha, despossuída, como se fosse um país de Terceiro Mundo em que a cultura só pode circular se estiver desprovida de valor econômico. Não dá pra aceitar essa cultura de camelô, que flerta com a informalidade, com a pirataria e até com a contravenção, tudo isso sob o pretexto de facilitar o acesso das comunidades ao conhecimento.

O maestro ainda diz defender a Lei HADOPI, que criminaliza e ameaça com corte da internet o usuário que baixa conteúdo sob proteção de direitos autorais, sempre tentando unir o “direito à propriedade” com um discurso pseudo-marxista transformado para defender a propriedade privada em direito de todos.

 

 

Por fim, o maestro finaliza dando a deixa para sua atual posição (ou a posição da ministra Ana de Hollanda) contrária ao uso do Creative Commons (grifo meu):

O grande conflito está em que temos, de um lado, as grandes corporações da indústria cultural, que lutam para ter “conteúdo de graça” para aumentar seus lucros e o valor de seus acervos no mercado; para isso, elas contam com o apoio ideológico de modelos supostamente inovadores (como o Creative Commons e outros), que visam tão-somente atrair os criadores incautos a ceder seus direitos e irem quietinhos para a boca do lobo; de outro lado, temos os criadores e produtores culturais, que necessitam ter a justa recompensa pelo uso de suas obras/produtos numa nova realidade cada vez mais capitalizada, onde tudo pode ser virtual – menos o dinheiro!

Não é surpresa, dada a posição anti-Creative Commons e pró ECAD do maestro que o mesmo tenha preparado manifesto em defesa da Ministra.Estranho apenas é sua ligação com a gravadora da ministra (CPC-UMES), comandada pelo MR8 de Valério Bemfica (ele mesmo responsável pela gravadora) que agora escreve textos atacando opositores de Ana de Hollanda.

 

 

Conclusão e hipóteses

Não é preciso, enfim, um grande esforço para notar que não é coincidência o fato do jornal A Hora do Povo, do minúsculo PPL/MR8, ter sido usado para atacar os defensores do Creative Commons.

Ana de Hollanda pertence à mesma gravadora comandada por um membro do Comitê Central do MR8 – autor do texto anti-CC – e cujo diretor artístico é o responsável pelo manifesto em sua defesa.

São no mínimo suspeitas estas ligações diretas entre a Ministra e um partido cuja gravadora (comandada via movimento estudantil) faz franca defesa de suas posições. Podemos estar diante de um flagrante sequestro de uma organização estudantil usada para fins particulares e de uma política suja de ataques velados através de laranjas e da defesa interessada da ministra.

Resta saber quem foi o mandante, o responsável por encomendar o texto e o manifesto. Até que ponto a ministra está envolvida. Seja como for, é preocupante que Ana de Hollanda se valha, direta ou indiretamente, deste tipo de artifício para tentar atacar seus opositores. Esta novidade apenas reforça nossa campanha que exige e saída imediata da ministra, que vem demolindo tudo que foi construído por Gil e Juca.

[Este texto contou com a inestimável contribuição de Sergio Pacheco (@sergiorauber) e Bruno Cava (@BrunoCava )]

MINISTRA ANA DE HOLLANDA DESMASCARADA: A POLÍTICA SUJA MINISTERIAL, pelo viés do colaborador Raphael Tsavkko*.

*Raphael Tsavkko é Jornalista, Mestrando em Comunicação (Cásper Líbero), Bacharel em Relações Internacionais (PUCSP) e blogueiro. Mantém o endereço Blog do Tsavkko – The Angry Brazilian, escreve (quase) semanalmente/mensalmente a coluna  “Defenderei a casa de meu pai” no portal anticapitalista Diário Liberdade, e autor e tradutor do portal Global Voices. Já colaborou diversas vezes com a revista o Viés, disponíveis aqui.

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