UNIVERSOS DE VIVÊNCIA

Este texto foi originalmente publicado na revista .txt. A charge é de autoria do estudante de jornalismo Rafael Balbueno.

 

 

Em 1972, estudantes de todo o país organizaram a Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil, a FEAB. Em plena ascensão da Revolução Verde, quando a agricultura se tornou uma atividade extensiva e altamente tecnológica, começou-se a discutir que tipo de desenvolvimento se almejava com a formação voltada ao mercado que as universidades brasileiras tinham importado das estadunidenses. Num país como o Brasil, em que 1% dos proprietários detêm metade das terras, os membros da FEAB queriam se distanciar dos laboratórios, das técnicas de plantio e das grandes colheitas para se aproximar da realidade da maioria  dos agricultores brasileiros.

Desse contexto, em 1989, surgiram os Estágios de Vivência. A frase que os resume vem na conclusão do libreto que a FEAB fez em 2005 para explicar o projeto, pelo qual é responsável: “como tornar a universidade um instrumento de construção de conhecimento que beneficie o conjunto da sociedade?”. O mote é analisar para quê, ou melhor, para quem serve o conhecimento adquirido no decorrer de anos na universidade.

Os EVs eram períodos de tempo que estudantes das ciências rurais passavam com famílias de agricultores vinculados aos Movimentos Sociais Populares a apreender dessa convivência a realidade social, econômica e cultural de produtores que, em grande parte, trabalhavam para sobreviver, contrapondo-se aos grandes latifúndios que ainda dominam o Brasil. O primeiro EV oficial aconteceu em 1989, em Dourados, no Mato Grosso do Sul. Antes desse, várias experiências aleatórias já tinham sido feitas, mas sem alinhamento nacional, como passou a existir no final da década de oitenta.

Logo nos próximos anos, estudantes de outras áreas começaram a se interessar pelos EVs, que passaram a, então, chamar-se Estágios Interdisciplinares de Vivência, os EIVs. Até hoje, estudantes de todas as ciências podem participar. “Sempre há algo a aprender”, conta Diego Pittini, estudante de Agronomia, ligado à coordenação dos EIVs na UFSM. Diego participou do projeto em 2008, quando passou dez dias com uma família de fumicultores em Santa Catarina.

O primeiro EIV da UFSM se deu oficialmente em 1998, mas já nos anos oitenta havia atividades que se assemelhavam à “filosofia eiviana” de hoje. O professor do Centro de Ciências Rurais Pedro Neumann participou de um deles em 1985, um ano antes de se formar em Agronomia. Quando perguntado sobre como um estágio de vivência muda a visão sobre a área, ele responde que “muda a abordagem da formação profissional”.

Esse é justamente o objetivo, confirma Diego. “Tu não interferes nas atividades, como nos estágios profissionais. Tu estás lá para ver como aquela família faz. E isso serve para se refletir sobre a formação que temos na universidade”.

Grandes fazendas, organismos geneticamente modificados, colheita exportada. A globalização não é o único caminho para quem participa dos EIVs. Como o que se aprende na universidade pode ser aplicado num contexto real e holístico? Como não ser formado para trabalhar exclusivamente em multinacionais e grandes fazendas? Como usar o conhecimento para trabalhar pela sociedade e não só tirar dela o sucesso [sic], medido pelo salário, pelo cargo e pelas aparições nas colunas sociais?

Os EIVs são o complemento à formação tecnicista da universidade atual. Através deles, os estudantes têm as chances de se aproximar de outras realidades e de re-arranjar o que aprendem para servir a toda a população e não somente a quem paga melhor. No fim, de complemento, os EIVs se tornam um canal com o propósito original das universidades: ser, enfim, universal.

 

UNIVERSOS DE VIVÊNCIA, pelo viés de Gianlluca Simi

gianllucasimi@revistaovies.com

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